Quadrilha
JOÃO AMAVA Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos. Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou-se com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. P. 54)
Esta é uma análise sintática do poema Quadrilha.
O poema Quadrilha inicia com a afirmação de que “João amava Teresa que amava Raimundo….”. Contando com este, são três versos em que o autor apresenta cinco vezes a conjunção que. Segundo Bechara (1999, p. 464), “a marca de que a oração independente passou pelo processo da subordinação, a funcionar como membro de uma outra oração, é o que”. Portanto, poderíamos transformar os primeiros versos subordinados do poema em pequenas orações independentes: “João amava Teresa. Teresa amava Raimundo”, e assim por diante. Ou mesmo em orações coordenadas: “João amava Teresa e Teresa amava Raimundo”. Seguramos essas orações para entender o que vem a seguir.
Nos versos, o que não somente sinaliza serem essas orações subordinadas, mas também funciona como anáfora para que não haja necessidade de se repetir os pronomes pessoais João, Teresa, Raimundo e todos os outros que se seguem. O que, também, é sujeito dentro das orações. Portanto, pronome relativo.
Duarte (2007) nos recomenda iniciar a análise da oração pelo verbo, uma vez que há orações sem sujeito que pedem somente um argumento: “Choveu”, por exemplo. Drummond coloca o primeiro ponto final logo após a oração “que não amava ninguém”. Para encontrar o sujeito da oração, precisamos observar o verbo flexionado no período composto (aquele que tem mais de uma oração) e definir a estrutura argumental que ele seleciona. “Amava”, no caso, pede alguém que ama alguém ou alguma coisa. Portanto, “quem João amava?” traz o argumento externo “Teresa”. O sujeito do período é, então, João, sendo Teresa objeto direto desse amor. Poderíamos, é claro, também perguntar “quem amava Teresa?”. Do mesmo modo, a resposta seria João. Mas “quem amava Raimundo?” nessa oração composta? É neste momento que observamos o que retomando Teresa e nos ajudando a encontrar a resposta: é Teresa que amava Raimundo. E assim sucessivamente até Lili, que não amava ninguém.
Se tomarmos a oração do seu início ao ponto final, teremos outros elementos a analisar: logo após a oração completa “João amava Teresa”, temos um grande adjunto adnominal que poderia ser removido sem afetar o entendimento da oração. Mas como efeito poético, ele se torna um elemento necessário, com um encadeamento chave.
Já na segunda parte do poema, nos versos de quatro a sete, temos cinco orações coordenadas separadas por vírgula e uma ligada pelo conector aditivo e, também chamada de conjunção coordenativa. A última oração, logo após a vírgula, é subordinada e também um adjunto adnominal. Esta última oração não apenas retoma o nome J. Pinto Fernandes (que não tinha entrado na história), mas tem o efeito de retomar os primeiros versos onde tem a maior ocorrência da conjunção que. Drummond poderia ter finalizado as cinco primeiras orações com um ponto final ou mantido todas elas conectadas pelo e que ainda assim se manteriam como coordenadas, mas, neste último caso, talvez gerasse uma certa estranheza na declamação de Quadrilha.
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